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Sind. Patrimonial - SINPA

A SINPA também é um procedimento inquisitorial, de acesso restrito, não contraditório e não punitivo, que visa colher dados e informações suficientes a subsidiar a autoridade competente na decisão sobre a deflagração de processo administrativo disciplinar. O seu escopo é delimitado, constituindo importante instrumento de apuração prévia de práticas corruptivas envolvendo agentes públicos, na hipótese em que o patrimônio destes aparente ser superior à renda licitamente auferida.

Nesse sentido, constitui a sindicância patrimonial um instrumento preliminar de apuração de infração administrativa consubstanciada em enriquecimento ilícito, tipificada art. 9º, VII, da Lei nº 8.429/92, possuindo previsão normativa no Decreto nº 10.571/2020, e no art. 5º, III, da IN CGU nº 14/2018.

A SINPA é um relevante instrumento à disposição da Administração Pública, desempenhando papel de destaque na apuração das infrações administrativas potencialmente causadoras de enriquecimento ilícito do agente público, na medida em que, mediante a análise da evolução patrimonial do agente, poderão ser extraídos suficientes indícios de incompatibilidade patrimonial capazes de instruir a deflagração do processo administrativo disciplinar propriamente dito – que poderá culminar na aplicação da pena de demissão (art. 132, IV, da Lei nº 8.112/90) e na propositura da ação de improbidade administrativa, nos termos da Lei nº 8.429/92.

Com efeito, o inciso VII do art. 9º da lei de improbidade administrativa estabelece que constitui enriquecimento ilícito “adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, de cargo, de emprego ou de função pública, e em razão deles, bens de qualquer natureza, decorrentes dos atos descritos no caput deste artigo, cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público, assegurada a demonstração pelo agente da licitude da origem dessa evolução”. Por outro lado, da leitura do art. 132, IV, da Lei nº 8112/90, depreende-se que o ato de improbidade administrativa praticado por servidor público federal constitui falta disciplinar e enseja a aplicação da penalidade de demissão.

Assim, na medida em que o enriquecimento ilícito do servidor constitui ilícito administrativo, a denúncia, notícia ou suspeita da prática dessa irregularidade deve ser apurada, ex vi do art. 143 da Lei nº 8.112/90. Entretanto, previamente à deflagração do processo administrativo disciplinar, poderá a autoridade competente valer-se da SINPA, na qual se procederá à análise da evolução patrimonial do servidor, com vistas a confirmar ou não o teor denunciativo e fundamentar a decisão pelo arquivamento ou pela instauração do processo contraditório.

Desta forma, consoante os artigos 13 e 14 do Decreto nº 10.571/2020, identificados indícios de enriquecimento ilícito, inclusive por evolução patrimonial incompatível do agente público, poderá ter lugar a instauração de sindicância patrimonial, pela CGU ou órgão ou entidade competente (de ofício ou por requisição da própria CGU).

A SINPA encontra-se regulamentada nos arts. 23 a 29 da IN CGU nº 14/2018. 

A instauração da SINPA opera-se com a emissão de portaria pela autoridade competente, na qual deverão constar os servidores designados para compor a comissão sindicante, o número do processo no qual constam os fatos que serão objeto de apuração e o prazo para a realização dos trabalhos.

De acordo com o art. 24 da IN CGU nº 14/2018, a SINPA será conduzida por comissão composta, no mínimo, por dois servidores efetivos, com indicação do presidente dos trabalhos. A estabilidade não é exigida e, conforme o quadro funcional das entidades, a comissão será composta por empregados públicos.

O prazo para a conclusão dos trabalhos será de trinta dias, contados da instauração da SINPA, podendo ser prorrogado pela autoridade instauradora para conclusão das investigações (cf. art. 14, §§ 1º e 2º do Decreto nº 10.571/2020 c/c art. 25 da IN CGU nº 14/2018).

A respeito da instrução da SINPA, veja-se o que estabelecem os arts. 26 e 27 da IN CGU nº 14/2018, in verbis:

Art. 26. A comissão de SINPA poderá solicitar a quaisquer órgãos e entidades detentoras de dados, tais como cartórios, departamentos estaduais de trânsito e juntas comerciais, informações relativas ao patrimônio do servidor ou empregado sob investigação, e de outras pessoas físicas e jurídicas que possam guardar relação com o fato sob apuração.

Art. 27. A apresentação de informações e documentos fiscais ou bancários pelo sindicado ou pelas demais pessoas que possam guardar relação com o fato sob apuração, independentemente de solicitação da comissão, implicará renúncia dos sigilos fiscal e bancário das informações apresentadas para fins da apuração disciplinar.

Da leitura, extrai-se que a comissão sindicante deve realizar todas as diligências postas ao seu alcance, no sentido de elucidar o fato sob investigação, inclusive tomando, se for o caso, o depoimento do sindicado e abrindo-lhe a oportunidade de apresentar justificativas para o eventual acréscimo patrimonial. Importa mencionar, porém, que tal providência não retira o caráter inquisitorial da SINPA.

Verifica-se, outrossim, que o escopo de apuração da comissão sindicante será eminentemente patrimonial, uma vez que deverá apurar, em termos qualitativo e quantitativo, a composição e o valor dos bens e direitos que integram o patrimônio do servidor, assim como as dívidas. E, para tanto, poderá se valer de fontes de consulta tais como Cartórios de Registros Imobiliários, Cartórios de Registros de Títulos e Documentos, Departamentos de Trânsito, Juntas Comerciais, Capitania de Portos, inclusive de outros entes da Federação.

É possível, ainda, a obtenção de acesso aos dados fiscais e bancários do sindicado.

No que se refere ao sigilo fiscal, a Lei Complementar nº 104, de 10 de janeiro de 2001, ao conferir nova redação ao art. 198 do Código Tributário Nacional, permitiu o seu afastamento pela via administrativa, não precisando a comissão sindicante recorrer ao Poder Judiciário para obter as informações fiscais do sindicado, as quais poderá solicitar, diretamente, aos órgãos fazendários. Eis o que dispõe o citado artigo, in verbis: 

Art. 198. Sem prejuízo do disposto na legislação criminal, é vedada a divulgação, por parte da Fazenda Pública ou de seus servidores, de informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades.

§ 1º Excetuam-se do disposto neste artigo, além dos casos previstos no art. 199, os seguintes:

I – requisição de autoridade judiciária no interesse da justiça; 

II – solicitações de autoridade administrativa no interesse da Administração Pública, desde que seja comprovada a instauração regular de processo administrativo, no órgão ou na entidade respectiva, com o objetivo de investigar o sujeito passivo a que se refere a informação, por prática de infração administrativa.

§ 2º O intercâmbio de informação sigilosa, no âmbito da Administração Pública, será realizado mediante processo regularmente instaurado, e a entrega será feita pessoalmente à autoridade solicitante, mediante recibo, que formalize a transferência e assegure a preservação do sigilo. (...) (grifou-se)

Nessa esteira, caberá à comissão solicitar ao órgão integrante da Advocacia-Geral da União competente o ajuizamento de processo de afastamento de sigilo bancário perante o órgão judiciário, devendo, para esse fim, demonstrar a necessidade e a relevância da obtenção dessas informações para a completa elucidação dos fatos sob apuração no bojo da sindicância patrimonial.

Vale lembrar que, ao acessar os dados protegidos por sigilo fiscal e/ou bancário, os servidores integrantes da comissão assumem o dever de manutenção do sigilo, impondo-se, portanto, redobrada cautela.

Ressalva-se que em decorrência da incidência do princípio constitucional da publicidade não incide a proteção ao sigilo bancário nas seguintes situações: a) operação bancária em que a contraparte da instituição financeira é pessoa jurídica de direito público; ou b) operação bancária que envolva recursos públicos, ainda que parcialmente, independentemente da contraparte da instituição financeira. Foi o estabelecido pelo Parecer Vinculante AGU Nº AM - 06, que adotou o Parecer Plenário nº 5/2017/CNU/ CGU/AGU, com a seguinte ementa: 

EMENTA: Direito Administrativo. Acesso às informações protegidas por sigilo bancário pelos órgãos de controle. Princípio da publicidade. Extensão ou compartilhamento de sigilo. Prevalência do princípio constitucional da publicidade, nos termos deste parecer. Oponibilidade do sigilo, quando existente, a órgãos de controle.

1. Além das hipóteses previstas no art. 1º, §§ 3º e 4º, da Lei Complementar nº 105, de 2001, não incide a proteção ao sigilo bancário, em decorrência da incidência do princípio constitucional da publicidade, ao menos nas seguintes situações: a) operação bancária em que a contraparte da instituição financeira é pessoa jurídica de direito público; ou b) operação bancária que envolva recursos públicos, ainda que parcialmente, independentemente da contraparte da instituição financeira. 

2. Para este fim, devem ser considerados recursos públicos aqueles previstos nos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, incluídos os orçamentos previstos no § 5º do art. 165 da Constituição.

3. Por coerência, também devem ser considerados públicos os recursos titularizados não pela coletividade como um todo, mas por coletividades parciais (como os trabalhadores regidos pela CLT ou servidores públicos) que sejam administrados pelo poder público, tal como o FGTS e o Fundo PIS-PASEP, mas apenas em relação à sua aplicação pelas instituições financeiras, excluídas as operações bancárias realizadas entre o banco e o titular de contas individualizadas (cotista do fundo), que continuam protegidas pelo sigilo bancário.

4. A exceção ao sigilo bancário decorrente do princípio da publicidade atinge apenas a operação inicial de transferência dos recursos públicos, e não as operações subsequentes realizadas pelo tomador dos recursos e decorrentes da disponibilização destes em conta corrente ou por outro meio.

5. A exceção ao sigilo bancário, decorrente da incidência do princípio constitucional da publicidade, não implica a supressão de outros sigilos previstos em lei ou em norma regulatória editada pela autoridade competente, em especial o Banco Central do Brasil ou a CVM – Comissão de Valores Mobiliários, cuja incidência sobre documentos apresentados à instituição financeira ou por ela produzidos deve ser verificada caso a caso.

6. Salvo na hipótese de celebração do convênio a que se refere o art. 2º, § 4º, I, da Lei Complementar nº 105, de 2001, o sigilo bancário, quando incidente, deve ser oposto inclusive ao Ministério Público, aos tribunais de contas e ao Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União, sendo inaplicáveis o art. 26 da Lei nº 10.180, de 2001, e o art. 8º, § 2º, da Lei Complementar nº 75, de 1993.

Apurado pela comissão quais os bens e direitos que integram o patrimônio do servidor e o valor de cada um deles, os sindicantes deverão cotejar o resultado obtido com a renda auferida pelo servidor investigado e a evolução do seu patrimônio declarado, com vistas a verificar se eventual acréscimo decorreu da evolução normal desse patrimônio, é dizer: se possui o devido lastro correspondente. Com o resultado obtido pela realização do fluxo de caixa e da análise patrimonial do servidor, a comissão estará apta a emitir o seu juízo de valor sobre o apurado, mediante a elaboração da peça denominada relatório.

O relatório, à luz do disposto no § 3º do art. 14 do Decreto nº 10.571/2020 e consoante o previsto no art. 28 da IN CGU nº 14/2018, deverá ser conclusivo e apontar se o conteúdo denunciativo encontra, ou não, guarida na evolução patrimonial apurada do servidor no exercício de mandato, de cargo, de emprego ou de função pública, e em razão deles, sugerindo, em consequência, a instauração de processo administrativo disciplinar ou o arquivamento da SINPA.

Conforme art. 29 da IN CGU nº 14/2018, em caso de confirmação dos indícios de enriquecimento ilícito, a autoridade julgadora comunicará os órgãos competentes, para as providências de sua alçada (MPF, TCU, CGU, SRFB, COAF, AGU).

Fonte: CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO. Manual de Processo Administrativo Disciplinar • 2022. Brasília: CGU, 2022.
                                                                   (http://www.cgu.gov.br/atividade-disciplinar)